A tecnologia está quebrando as barreiras de acessibilidade no transporte — aqui está como

Tech breaking accessibility barriers in transportation - here's how

De acordo com a OMS, pessoas com deficiência representam 16% da população mundial. Elas também enfrentam 15 vezes mais dificuldades no transporte do que indivíduos sem deficiência. Mas para que a mobilidade seja verdadeiramente sustentável, ela precisa ir além da redução de emissões; ela precisa ser inclusiva e atender a todos os membros da sociedade.

Nesse sentido, a tecnologia representa uma luz no fim do túnel, assim como uma ferramenta inestimável. Para saber mais sobre seu papel na promoção do transporte universalmente acessível, conversei com Jonathan Chacón Barbero, Engenheiro Sênior de Software de Acessibilidade na Cabify.

“A tecnologia nos ajuda a superar nossos limites.”

Chacón Barbero ingressou na empresa de transporte por aplicativo em 2019 e é responsável pelo menu de acessibilidade do aplicativo. Ele possui uma carreira de vários anos no design e desenvolvimento de aplicações acessíveis, além de ter atuado como consultor e professor de acessibilidade. Ele também está entre os poucos engenheiros de software cegos da Europa.

“A primeira vez que tive um computador pessoal quando criança, foi amor à primeira vista”, diz Chacón Barbero. “Foi quando decidi que queria ser cientista da computação.” Aos cinco anos, ele construiu seu primeiro programa de software e, aos nove anos, decidiu se concentrar em hardware.

Chacón Barbero conseguia enxergar com o olho direito até os 15 anos de idade, momento em que perdeu completamente a visão, levando-o a trabalhar com software.

Jonathan Chacón Barbero. Crédito: Cabify

“O pior momento da minha vida foi quando fiquei cego e tive que ficar três meses fora da tecnologia”, lembra ele. “Eu não conhecia o braille. Eu não entendia os computadores para cegos. Eu não sabia nada sobre o mundo dos cegos. Tive que entender e estudar tudo. Acho que naquele momento, eu defini minha mente para o resto da minha vida.”

Ele enfatiza que, a partir desse ponto, a tecnologia adquiriu um significado duplo em sua vida: não era mais apenas uma paixão, mas também uma ferramenta para enfrentar desafios relacionados à sua condição.

“A tecnologia nos ajuda a superar nossos limites”, acrescenta ele. E isso é o que ele se propôs a fazer.

Barreiras de acessibilidade e impacto

Os desafios de transporte enfrentados por pessoas com deficiência vão muito além da falta de rampas acessíveis. Entre outros, eles incluem veículos inacessíveis, meio-fios, faixas de pedestres e calçadas mal projetados, sinalização inexistente ou inacessível, informações de orientação e planejamento de viagens.

Além disso, estudos têm mostrado que barreiras sociais e infraestruturais tornam modos de transporte específicos indisponíveis para viajantes com deficiência e aumentam o tempo de viagem. Como resultado, pessoas com deficiência fazem menos viagens e percorrem distâncias menores.

“A deficiência ainda não é reconhecida por toda a sociedade.”

No Reino Unido, por exemplo, uma pesquisa de 2022 constatou que uma em cada cinco pessoas com deficiência não consegue viajar devido à falta de opções de transporte adequadas, enquanto uma em cada quatro afirmou que atitudes negativas de outros passageiros as impedem de usar o transporte público.

Chacón Barbero compartilha um exemplo de sua experiência com o uso de serviços de táxi.

“Eu tenho que ligar para uma empresa de táxi. Fico esperando na linha enquanto aguardo o motorista chegar. Mas há um problema: ele não sabe que eu não consigo ver o carro e eu não posso saber onde o carro está. Eu perco tempo e dinheiro porque não houve comunicação direta entre o motorista e o usuário.”

Colocando a tecnologia para funcionar

De forma otimista, nos últimos anos tem havido um número crescente de iniciativas públicas e privadas que utilizam novas tecnologias para enfrentar o desafio da acessibilidade universal.

Por exemplo, a cidade de Lyon desenvolveu um aplicativo de transporte público que utiliza dados em tempo real para auxiliar pessoas com deficiência a se locomoverem, incluindo um recurso que ajuda a identificar o itinerário mais acessível e as rotas mais curtas.

Startups europeias também estão ativas nesse campo. Pense na Wayfindr, sediada em Londres, que ajuda pessoas com deficiência visual a viajarem de forma independente usando navegação por áudio. Ou na Noteabox, cujo aplicativo Button permite que os usuários pressionem botões, como os de travessias de pedestres, por meio de seus smartphones.

“A tecnologia é a solução para muitos aspectos de acessibilidade.”

A Cabify apresenta outro exemplo de como a tecnologia pode aumentar a inclusão nos serviços de transporte por aplicativo.

Quando Chacón Barbero ingressou na empresa espanhola, seu primeiro passo foi construir uma base semântica para a interface digital do aplicativo, a fim de permitir a adição gradual de várias funcionalidades de acessibilidade e perfis de deficiência. No mesmo ano, o aplicativo da Cabify se tornou 100% acessível para pessoas cegas.

Em 2020, a empresa lançou seu menu de acessibilidade. Desde então, tem adicionado funcionalidades e ampliado seus grupos-alvo, como deficientes auditivos, pessoas com deficiências cognitivas e idosos.

“Criamos um menu especial para acessibilidade em nossa jornada para oferecer ao usuário a possibilidade de identificar suas necessidades especiais”, diz Chacón Barbero.

Os usuários podem escolher entre as três opções exibidas na imagem abaixo:

Menu de acessibilidade da Cabify. Crédito: Cabify

A primeira opção é projetada para ajudar pessoas com deficiência visual, idosos e pessoas com mobilidade reduzida a informar os motoristas de que precisam de ajuda para chegar ao veículo.

Para usuários com deficiência auditiva, a segunda opção de acessibilidade oferece a possibilidade de conversar em vez de ligar. Por fim, receber e reproduzir alertas importantes por voz atende a vários grupos, como idosos, deficientes visuais e pessoas com deficiências cognitivas.

De acordo com a Cabify, até o final de 2022, mais de 99.000 usuários haviam ativado pelo menos uma das funcionalidades do menu de acessibilidade. Agora, esse número ultrapassa 110.000 usuários em todo o mundo.

Chacón Barbero diz que usuários sem deficiência também ativaram os recursos de acessibilidade, pois sentem que otimizam a experiência. Ele menciona a preferência por um tamanho de fonte maior e a opção de conversar em vez de ligar “simplesmente porque muitas pessoas odeiam ligações telefônicas”.

Mas para Chacón Barbero, seu trabalho está longe de terminar – pelo contrário, ele defende a necessidade de melhoria contínua. Seus planos futuros incluem adicionar novas funcionalidades no aplicativo, ampliar os perfis de usuários com deficiência e aumentar o número de carros acessíveis.

A maior barreira a ser quebrada

Para Chacón Barbero, a maior barreira para a mobilidade inclusiva é a falta de conscientização e aceitação social.

“A acessibilidade é desconhecida, porque a deficiência ainda não é reconhecida por toda a sociedade. Somente quando você tem um amigo, um pai ou alguém em seu ambiente com deficiência, você entende o que é acessibilidade. E esse é o problema”, ele diz.

Os números do Eurostat são reveladores: em 2022, 29,7% da população da União Europeia com deficiências com mais de 16 anos estavam em maior risco de pobreza ou exclusão social.

Chacón Barbero espera que, no futuro, a sociedade seja mais inclusiva e reconheça que pessoas com deficiências são, acima de tudo, pessoas. Ele acredita que as gerações mais jovens podem impulsionar a mudança ao abraçar ainda mais indivíduos diferentes e diversos.

“A tecnologia é a solução para muitos aspectos relacionados à acessibilidade, mas tem seus limites”, conclui Chacón Barbero, indicando a necessidade de ação humana também. “A solução não é apenas a tecnologia. A solução é a tecnologia para as pessoas e com as pessoas.”